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terça-feira, 28 de setembro de 2010

Ademar Macedo (Livro de Trovas)

DO RIO GRANDE DO NORTE

A mais triste Solidão
que os seres humanos têm
é abrir o seu coração...
olhar... e não ver ninguém!

Almoço e janto poesia.
E neste meu universo,
mastigo um pão todo dia
amanteigado de verso.

Após causar desencantos
e nos fazer peregrinos,
a seca fez chover prantos
nos olhos dos nordestinos!

A vida escreve-me enredos
com finais que eu abomino.
Meus sonhos viram brinquedos
nas mãos cruéis do destino...

Com os temas mais dispersos,
eu mesmo me fiz enchente
numa enxurrada de versos
jorrando da minha mente...

Da Bebida fiquei farto,
bebendo perdi quem amo;
hoje bebo no meu quarto
as lágrimas que eu derramo.

Da fonte que jorra o amor,
Deus, na sua imensidão,
faz jorrar com todo ardor
as carícias do perdão.

Debruçado sobre a mata,
o Luar, tal qual pintor,
pinta as folhas cor de prata
e pinta o chão de outra cor.

Depois que chove na mata,
a lua, de luz acesa;
pinta as folhas cor de prata
com tintas da Natureza.

Descobri no envelhecer,
em meus momentos tristonhos,
que eu não tive, em meu viver,
nada mais além de sonhos!...

Descobri no envelhecer
que a musa que me enaltece
não deixa o verso morrer,
pois musa nunca envelhece!

Do fogo no matagal,
na fumaça que irradia,
vejo um câncer terminal
no pulmão da ecologia!...

Entre os atos de bonança
e meus pecados mortais,
quando eu botar na balança,
Deus sabe quais pesam mais!...

Envolto numa utopia,
num devaneio sem fim,
vivo hoje uma fantasia
que eu mesmo inventei pra mim.

Fiz minha casa de barro
ao lado de uma favela.
Lá fora, eu sei, não tem carro,
mas tem amor dentro dela!...

Mesmo em momentos tristonhos,
carregada de lamentos,
navega cheia de sonhos
a Nau dos meus pensamentos!...

Mesmo na dor, pus de pé,
com esperanças sem fim,
a Fortaleza de fé
que existe dentro de mim.

Muda-se a cor preferida;
troca-se a corda do sino;
muda-se tudo na vida;
mas não se muda o destino...

Não se estresse nem me agrida,
ouça a voz do coração.
Deixe que o Tempo decida
quem de nós dois tem razão!...

Na transposição mais nobre,
podemos, sem qualquer risco,
matar a sede do pobre
com as águas do São Francisco!...

Nossa cultura se entende
nas lições que eu mesmo tive:
o saber a gente aprende,
a cultura a gente vive.

Numa caminhada inglória,
com minha alma enternecida;
pude ver a minha história
no retrovisor da vida.

Numa combatividade,
cheia de brilho e de glória,
saber perder, na verdade,
é também uma Vitória!

Num afago em seus cabelos,
num carinho em sua face,
vi que, através de desvelos,
um grande amor também nasce...

Num devaneio qualquer,
feito de sonho e de imagem,
no seu corpo de mulher
fiz a mais linda viagem.

Num triste e cruel enredo
escrito por poderosos,
a Terra treme com medo
das mãos dos gananciosos...

O Deus que fez lago e monte,
que fez céu, mar, noite e dia,
fez do poeta uma fonte
por onde jorra poesia...

O grande desmatamento,
por ganância ou esperteza,
põe rugas de sofrimento
no rosto da natureza...

O meu primo se reveza
entre beber e rezar.
Ás sete ele está na reza
e as oito e meia no bar!!!

O Pantanal se engalana,
mas eu mesmo desconfio;
que até a própria chalana
sente ciúmes do rio.

Para alcançar a pujança,
basta-me ter, sem fadigas,
a força e a perseverança
do Trabalho das formigas!...

Passam sempre em meu portão,
trazendo um fardo de dor,
crianças que não têm pão,
pedindo “um pão por favor”!...

Pela insensatez da idade
e pelo que o amor requer,
choro, às vezes, de saudade
fingindo outra dor qualquer!

Perdido, pois, nas rotinas,
nos labirintos da dor,
encontrei entre as ruínas
pedaços do nosso amor...

Por minha fé ser tamanha,
pude remover enfim,
pedaços de uma montanha
que tinha dentro de mim...

Por ter a lingua de trapo,
disse, ao ser mandado embora:
- É moleza engolir sapo...
o duro é botar pra fora!

Quando a inspiração lhe acena,
o bom Trovador se expande.
Numa Trova tão pequena,
faz um poema tão grande!

Quando de um amor me aparto,
em tristezas me esparramo:
bebo sozinho em meu quarto
as lágrimas que eu derramo!

Quem se entrega a solidão
e dela se faz refém,
anda em meio à multidão
mas não enxerga ninguém!

Queria ao fim da jornada,
na manhã do meu adeus,
ver o brilho da alvorada
na luz dos olhos de Deus!

Que venham chuva e calor,
que os ventos desçam ou subam,
pois ninhos feitos de amor
tempestades não derrubam...

Se a vida é apenas passagem
quero que me façam jus;
na minha última viagem
deixem que eu veja Jesus!

Sem galinha cabidela,
sem ter arroz nem feijão,
hoje eu botei na panela
meu sapo de estimação!...

Sou matuto em alto astral
e um velho muito ranzinza.
Só festejo o Carnaval
na quarta-feira de cinza!

Tem cão que mora no morro,
outro morando em mansão;
porque nem todo cachorro
leva uma vida de cão.

Traz alentos, novas vidas,
muda a cor da plantação;
a chuva sara as feridas
que a seca faz no sertão.

Vejo sentadas no chão,
trajadas de desamor,
crianças comendo pão
amanteigado de dor!

Versos já fiz - não sei quantos -
relembrando a mocidade.
Hoje servem de acalantos
para ninar a saudade.

Vi à luz de lamparina,
em inspirações imerso
que a musa se faz menina
para brincar no meu verso.

Visita pra meter medo,
que nem vassoura adianta,
É aquela que chega cedo
e só sai depois que janta!

Vou vender meus poemetos
na feira, seja onde for,
e comprar alguns espetos
para espetar "julgador"!

ADEMAR MACÊDO

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