Caros amigos e leitores: nos últimos cinco anos, sempre no mês de dezembro eu costumo enviar para alguns amigos essa crônica natalina do jornalista, poeta, compositor e radialista alagoano Aldemar Paiva. Ouvi-a pela primeira vez na década de 60 pela rádio Rural de Natal. Devia ter uns 16 a 17 anos de idade e fiquei muito comovido. Tentei, em vão, conseguir uma cópia daquilo que escutei e tanto me impressionou. Aquele relato me marcou de tal maneira que desde então, sempre quando se aproxima as festas natalinas eu me recordo daquela história que ouvira há tantos anos atrás. O pior é que eu não sabia o nome do autor, o título daquela crônica, enfim, nada que pudesse localizá-la. Como nada sabia, não tinha como procurá-la. E como desejei ouvi-la novamente! . . . Havia ficado marcado em mim, para sempre, a dor daquele menino, filho de operário, que recebera do pai um trenzinho como presente de natal e logo depois, entre lágrimas e apelos, sem nenhuma explicação, teve que devolvê-lo. Não pude deixar de fazer um comparativo com os garotos mais afortunados que recebem, durante as festas natalinas, dezenas de presentes e, na maioria das vezes, poucos os valorizam.
Procurei essa crônica durante toda a vida, mas sem sucesso. Em meados de 2006, já com meus 56 anos de idade, assistia ao “Programa Senhor Brasil” do cantor e apresentador Rolando Boldrim, e para minha surpresa, ele interpretou a “Crônica Natalina” ou “Monólogo do Natal”. Fiquei em êxtase! . . . Depois de tantos anos de procura ali estava, um artista do quilate de Rolando Boldrim, interpretando com toda a maestria que lhe é peculiar, aquela crônica que procurei por todos esses anos. A partir daí, não foi difícil conseguir uma cópia daquela tão sonhada crônica e hoje divido a minha emoção e do autor com vocês.
Grande abraço a todos e boa reflexão,
Ormuz Barbalho Simonetti
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Monólogo do Natal
Aldemar Paiva
Eu não gosto de você, Papai Noel!
Também não gosto desse seu papel de vender ilusões à burguesia.
Se os garotos humildes da cidade soubessem do seu ódio à humildade, jogavam pedra nessa fantasia.
Você talvez nem se recorde mais.
Cresci depressa, me tornei rapaz, sem esquecer, no entanto, o que passou.
Fiz-lhe um bilhete, pedindo um presente e a noite inteira eu esperei, contente.
Chegou o sol e você não chegou.
Dias depois, meu pobre pai, cansado, trouxe um trenzinho feio, empoeirado, que me entregou com certa excitação.
Fechou os olhos e balbuciou: “É pra você, Papai Noel mandou”.
E se esquivou, contendo a emoção.
Alegre e inocente nesse caso, eu pensei que meu bilhete com atraso, chegara às suas mãos, no fim do mês.
Limpei o trem, dei corda, ele partiu dando muitas voltas.
Meu pai me sorriu e me abraçou pela última vez.
O resto eu só pude compreender quando cresci e comecei a ver todas as coisas com realidade.
Meu pai chegou um dia e disse, a seco: “Onde é que está aquele seu brinquedo?
Eu vou trocar por outro, na cidade”.
Dei-lhe o trenzinho, quase a soluçar e, como quem não quer abandonar um mimo que nos deu, quem nos quer bem, disse medroso: “O senhor vai trocar ele?
Eu não quero outro brinquedo, eu quero aquele.
E por favor, não vá levar meu trem”.
Meu pai calou-se e pelo rosto veio descendo um pranto que, eu ainda creio,
Tanto e tão santo, só Jesus chorou!
Bateu a porta com muito ruído, mamãe gritou; ele não deu ouvidos. Saiu correndo e nunca mais voltou.
Você, Papai Noel, me transformou num homem que a infância arruinou. Sem pai e sem brinquedos.
Afinal, dos seus presentes, não há um que sobre para a riqueza do menino pobre que sonha o ano inteiro com o Natal.
Meu pobre pai doente, mal vestido, para não me ver assim desiludido, comprou por qualquer preço uma ilusão e, num gesto nobre, humano e decisivo, foi longe pra trazer-me um lenitivo, roubando o trem do filho do patrão.
Pensei que viajara, no entanto, depois de grande, minha mãe, em prantos, contou-me que fora preso.
E como réu, ninguém a absolvê-lo se atrevia.
Foi definhando, até que Deus, um dia, entrou na cela e o libertou pro céu.
Também não gosto desse seu papel de vender ilusões à burguesia.
Se os garotos humildes da cidade soubessem do seu ódio à humildade, jogavam pedra nessa fantasia.
Você talvez nem se recorde mais.
Cresci depressa, me tornei rapaz, sem esquecer, no entanto, o que passou.
Fiz-lhe um bilhete, pedindo um presente e a noite inteira eu esperei, contente.
Chegou o sol e você não chegou.
Dias depois, meu pobre pai, cansado, trouxe um trenzinho feio, empoeirado, que me entregou com certa excitação.
Fechou os olhos e balbuciou: “É pra você, Papai Noel mandou”.
E se esquivou, contendo a emoção.
Alegre e inocente nesse caso, eu pensei que meu bilhete com atraso, chegara às suas mãos, no fim do mês.
Limpei o trem, dei corda, ele partiu dando muitas voltas.
Meu pai me sorriu e me abraçou pela última vez.
O resto eu só pude compreender quando cresci e comecei a ver todas as coisas com realidade.
Meu pai chegou um dia e disse, a seco: “Onde é que está aquele seu brinquedo?
Eu vou trocar por outro, na cidade”.
Dei-lhe o trenzinho, quase a soluçar e, como quem não quer abandonar um mimo que nos deu, quem nos quer bem, disse medroso: “O senhor vai trocar ele?
Eu não quero outro brinquedo, eu quero aquele.
E por favor, não vá levar meu trem”.
Meu pai calou-se e pelo rosto veio descendo um pranto que, eu ainda creio,
Tanto e tão santo, só Jesus chorou!
Bateu a porta com muito ruído, mamãe gritou; ele não deu ouvidos. Saiu correndo e nunca mais voltou.
Você, Papai Noel, me transformou num homem que a infância arruinou. Sem pai e sem brinquedos.
Afinal, dos seus presentes, não há um que sobre para a riqueza do menino pobre que sonha o ano inteiro com o Natal.
Meu pobre pai doente, mal vestido, para não me ver assim desiludido, comprou por qualquer preço uma ilusão e, num gesto nobre, humano e decisivo, foi longe pra trazer-me um lenitivo, roubando o trem do filho do patrão.
Pensei que viajara, no entanto, depois de grande, minha mãe, em prantos, contou-me que fora preso.
E como réu, ninguém a absolvê-lo se atrevia.
Foi definhando, até que Deus, um dia, entrou na cela e o libertou pro céu.
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