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domingo, 26 de junho de 2011

A ESCRITORA CEARAMIRINENSE "LÚCIA HELENA" RELEMBRA SEU VALE NESTE TEXTO

GUARDO NOS OLHOS, NA ALMA E NO CORAÇÃO, O EXUBERANTE PÉ DE ACÁCIA ROSA DA FAZENDA SANTA ÁGUEDA.



O PÉ DE ACÁCIA - SENTINELA DE TODAS AS HORAS, A BÚSSOLA APONTANDO OS CAMINHOS!
O CANAVIAL - UMA VISÃO DE SONHOS E PARA OS QUE SABEM SONHAR, SOB O CLARÃO DO SOL, DAS LUAS, OU EM PLENA AURORA!


NA ESTRADA, OS PÉS DE XIQUE-XIQUE COM SUAS FLORES DELICADAS E SEUS FRUTOS EM MEIO AOS ESPINHOS, PORÉM DELICIOSAMENTE DEGUSTADOS PELOS BOIS.


Onde buscar palavras para descrever um bordado de flores de todas as cores e formas, quando de minhas idas, com papai (*), à sua Fazenda Santa Águeda, no vale verde do Ceará-Mirim, onde uma acácia cor de rosa apontava os caminhos?
As palavras, na verdade, perdem-se no meu emaranhado de pensamentos, lembranças e sentimentos de tempos felizes da infância e adolescência, entre Ceará-Mirim e Natal/-RN.
Lembro-me, ainda menina, das muitas vezes que visitei a fazenda. Lá estava o estendal verde arreganhando suas asas sob o baloiço do vento. De Ceará-Mirim, até Santa Águeda, o percurso (naqueles tempos, com as estradas em péssimas condições) levava de 40 a sessenta minutos. Um tempo que devotava às minhas contemplações diante da vegetação perfumada e bela: as oitiças (árvores bem altas); os xique-xiques, mesmo sob a inclemência do sol, exibindo seus frutos e flores;
as palmeiras abanando-se com seus leques gigantes; os pés de açafrão enfeitando as cercas humildes; as babosas brilhantes e serenas; os quintais com pés de matruço e as hortaliças; a vegetação importante de tirar mau olhado: arruda; pinhão roxo também resguardando a sorte; as galinhas passando na estrada, cabritos, vacas, jumentos...os cães latindo, como a avisar a presença de intrusos.
Essas eram as viagens mais belas que eu fazia dentro de mim mesma, vendo e revendo caminhos de outrora, ouvindo as vozes dos meus avós e dos compadres dos meus pais.
Já morando em Natal, vez ou outra visitava a fazenda: era grande, com plantação de cana-de-açúcar que à época, na boa safra, era fornecedora do produto aos engenhos e usinas.
Lembro-me do canavial de Santa Águeda - até hoje, como se fosse a grande tela de Van Gogh - com a natureza completamente viva, verde e luminosa. Tudo isso me provocava sensação incomparável: após percorrer caminhos pedregulhos, árvores de sertão em solo duro castigado pela falta de água, a visão do canavial era um presente ao olhos. Alí estava o canavial com sua exuberância, suas palhas alvoroçadas ao soprar dos ventos, os raríssimos pássaros azuis e simples pardais cruzando os ares, a passagem pela ponte do rio Àgua Azul, com seus olheiros de águas escuras e misteriosas, espelhando meu rosto de menina.
Chegávamos cedinho, montávamos nos cavalos, juntamente com o capataz - sr. Auto - homem sério, de bom caráter e percorríamos a fazenda com suas canas altaneiras.
Bem antes de chegarmos à primeira porteira, logo avistávamos o gigante cor-de-rosa: o pé de acácia! Parecia um poema, um buquê rosa de flores maravilhosamente nascidas como filhas do astro rei.
Dona Diva, a esposa do capataz estava sempre a debulhar feijão verde. Dava gosto vê-la em passos ágeis até a hortaliça trazendo coentro, cebolinhas, tomates perfumados e pimentões. Colocava tudo na panela do feijão - panela de barro, no fogão de barro e à lenha.
N´outra panela a galinha (torrada) - galinha criada no terreno - cujos ovinhos ela separava para mim. Meu pai nunca se descuidava e levava mantimentos para o dia em que passávamos lá.
Em Santa Águeda havia uma pequena criação de caprinos e uma vez ou outra dona Diva matava um bicho desse (dava pena a forma como eram mortos com mão de pilão), fazia o picado dentro do bucho costurado com linha e agulha (eu ficava horrorizada), ao final, uma prato saboroso que degustava com muita ânsia.
Papai tinha uma rede na Fazenda onde tirava um cochilo após o almoço. Eu ficava jogando milho para as galinhas ou ajeitando os jarros de plantas de dona Diva.
Hoje, só para lembrar o pé de acácia indicando o caminho para a fazenda Santa Águeda, continua em seu lugar, dando sombra e flores.
Ali deixei o paraíso onde fui sempre tão feliz, numa casa com alpendre branco, combogós e doze pilares com jarros de plantas penduradas. A casa onde um canavial se exibia e as algarobas enfeitavam a entrada do terreno...e os pássaros voavam e cantavam as suas harmonias!

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(*) Abel Antunes Pereira (meu pai)


Um comentário:

  1. Me fez recordar os tempos de infancia!Sempre as tardes estava eu, sentado na calçada da igreja a contemplar, a beleza dos canaviais.Quantas vezes sonhei sobrevoando sobre aquele tapete verde! Sonho de Ícaro,Ali Baba? Só sei que esses sonhos,me deu esperanças,forças p/ eu ser o que sou hoje! Obrigada Lucia,pelo prazer da leitura que vc me proporcionou,adorei.Que o espirito maior do universo,ilumine e abençoe vc de muita saude e paz.Abraçãodo amigode sempre,Marcos Câmara.

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